quarta-feira, setembro 19, 2007

Palavras amigas

Estávamos na década de 90 do século passado quando começaram a aparecer por cá uns tijolos arrepiantes de levar ao ombro, com quilos de peso, usados fundamentalmente por jornalistas e empresários de gabarito: os primeiros telefones móveis.

Mas estes objectos só puderam merecer a abreviatura de telemóvel anos mais tarde, embora mesmo assim ainda fossem demasiado caros para o cidadão comum; e o peso e o tamanho impedissem ainda qualquer veleidade de generalização.

O resto da história, conhecemo-la todos: os telebichos encolheram drasticamente, de preço e de aparato, vieram os mimos e as vitaminas, depois as sms e as mms, a Internet… e arrisco dizer que nesta sala haverá provavelmente tantos telemóveis quantas as pessoas. Se não mais.

As vidas pessoais e profissionais dos mortais mais insuspeitos já não passam sem toda esta mobilidade, este aparato do estar obrigatoriamente sempre lá, sempre mais perto do que é supostamente importante.

Se houver bateria e cobertura, todas as novidades, boas e más, ou simplesmente assim-assim, podem chegar-nos à orelha. Em directo, através de mensagens de voz ou mensagens escritas – e hoje até, se quisermos, em chamadas de voz já com vídeo.

Pois foi para este cabaret de falatório que saltou do convento, há alguns anos, o nosso autor de hoje. E a dita vida real não lhe escapou ao espírito observador e inquisidor, nem ao humanismo com que fundou o seu edifício de relações sociais.

Nestas suas 3 estórias que agora podemos conhecer, como nas histórias de tantas outras "Ritas", "Bernardos" e "Augustas" com quem nos cruzamos, no ritmo alucinante desta Lisboa – ou de outra qualquer cidade do planeta – há vidas feitas de imprevisto, de alegrias, de tristezas. De fachadas falsas e muralhas fechadas que, por mais altas e impenetráveis que sejam, podem por vezes ser derrubadas com uma simples frase.

E neste mundo de hoje, onde a palavra pode viajar por telemóvel no segundo, sem cuidados, sem burilamentos e sem frente-a-frentes, os sentimentos do outro podem, à distância, ser tão descartáveis quanto uma bateria de lítio. E um pequeno objecto tecnológico ganha o poder imenso de juntar, umas vezes; e romper, outras.

Hoje, o telemóvel não é agente passivo da mudança. E força-a em pequenos circuitos interpessoais, mesmo que a vida, genericamente falando e como o João refere com subtil ironia – “continue o ritmo normal, sem percalços a nível nacional e mundial”.

3 Estórias Móveis não vem agitar o país nem o mundo.

Mas agitou o autor a ponto da urgência despretensiosa de soltar histórias de vidas guardadas onde todos nós, como peças de puzzle, podemos encaixar um dia, com mais ou menos ajustes.

Faremos bem, em apreciar estas.

E que venham as próximas.

Estas foram as palavras amigas que o Ricardo proferiu no lançamento do livro, ontem!

Obrigado, amigo.


1 comentário:

Diogo Moura disse...

O Ricardo escreve bilhantemente. As palavras certas, na ocasião certa, dirigidas à pessoa certa.